Pe. Geraldo Martins

O exemplo que vem da Família de Nazaré

No centro de toda vida familiar há de estar sempre o amor, “que é o vínculo da perfeição” (Cl 3,14). Sem ele, a família se degenera, as relações se corroem, o caos se estabelece. Só a família que se deixa conduzir pelo amor é capaz de viver a misericórdia, a bondade, a humildade, a mansidão, a paciência e o perdão, sendo um suporte para o outro (cf. Cl 3,12s).


Festa da Sagrada Família – 31 de dezembro de 2023
Eclo 3,3-7.14-17a
Sl 127(128),1-2.3.4-5 (R. cf.1)
Cl 3,12-21
Lc 2,22-40

 

familia-nazareA liturgia deste domingo convida-nos a refletir, mais uma vez, sobre a instituição humana mais importante para a sociedade: a família. Apresentada pela Igreja como modelo de todas as famílias, a Família de Nazaré aponta o caminho a ser trilhado por nossas famílias na direção de ser imagem e reflexo do amor divino na terra. Para tanto, é preciso olhar para ela como família humana, do contrário, não compreenderemos a vocação da família segundo os desígnios de Deus.

Gostaria de destacar três aspectos sobre a família que emergem da mesa da palavra proclamada na liturgia desta festa. O primeiro deles é a obediência da Família de Nazaré à lei de Deus. Maria e José, cientes de seu dever de pais, levam seu recém-nascido para ser apresentado ao Senhor e, na oportunidade, oferecer o sacrifício que lhes é devido. Como é bonito ver o zelo dos pais no cumprimento de sua fé! Não retardam nem arranjam desculpas, como ocorre com inúmeros pais e mães, para cumprir seu dever de introduzir seu filho na vida de fé. Nem mesmo a pobreza faz que negligenciem seu compromisso com a religião. Que exemplo para tantos que, por nada, deixam de cumprir seus deveres e suas responsabilidades no testemunho do que afirmam crer.

O segundo aspecto é a admiração de Maria e José sobre o que dizem de seu filho. Saber admirar os filhos é próprio de quem ama e confia que o Senhor conduzirá sua vida e seu destino, ainda que incertos e imprevisíveis. Quando Simeão toma o menino Jesus nos braços e o descreve como “salvação, luz dos povos e glória de Israel” (cf Lc 2,30-32), revela que Ele é o enviado de Deus, esperado por toda a humanidade. Podemos dizer, então, que todo filho, fruto do amor dos pais, é dom de Deus para a humanidade. Isso contrasta com a cultura antivida que cresce assustadoramente entre casais que optam por não terem filhos sob muitas alegações, nem sempre respaldadas no sentido do amor conjugal. Filho é sempre bênção de Deus. Os pais, como Maria e José, sabem admirar seus filhos e sua família?

Outro aspecto da Família de Nazaré que nos inspira é sua confiança nos planos de Deus. Diante da profecia de Simeão, que indicava Jesus como sinal de contradição e que revelava a dor pela qual Maria iria passar (cf Lc 2,34s), nada de desespero ou revolta. Silêncio, contemplação, abandono nas mãos de Deus, confiança plena em seu projeto! Assim, Maria e José “voltaram à Galileia, para Nazaré, sua cidade”. Alegres por terem cumprido a Lei do Senhor (Lc 2,39), retomam a rotina de suas vidas,  prontos para seguir os seus caminhos segundo a vontade de Deus.

A Família de Nazaré, no cumprimento de sua missão na obediência, na admiração e na confiança em Deus, torna-se paradigma para todas as famílias, nas suas mais diversas configurações. Deus mora em todas elas e nos fala através de cada uma delas.

Os conselhos do Eclesiástico, proclamados na primeira leitura, devem se constituir em referência segura para a relação de pais e filhos na busca da harmonia familiar. Honrar pai e mãe, conforme prescreve o quarto mandamento, é, antes de tudo, reconhecer no amor dos pais o amor do próprio Deus. Por isso, os filhos que respeitam os pais terão vida longa, o perdão dos pecados e a oração atendida (cf. Eclo 3,3-7). Isso implica nunca desamparar os próprios pais, especialmente, quando estiverem velhos ou necessitados de cuidados especiais.

No centro de toda vida familiar há de estar sempre o amor, “que é o vínculo da perfeição” (Cl 3,14). Sem ele, a família se degenera, as relações se corroem, o caos se estabelece. Só a família que se deixa conduzir pelo amor é capaz de viver a misericórdia, a bondade, a humildade, a mansidão, a paciência e o perdão, sendo um suporte para o outro (cf. Cl 3,12s).

Não ignoramos as dificuldades e conflitos de ordem econômica, social, política, cultural e até religiosa que trazem dor e sofrimento a milhões de famílias. Basta olharmos ao nosso redor para perceber as famílias sem acesso aos direitos fundamentais como moradia, alimentação, saúde, educação, lazer, cultura, trabalho. Da Família de Nazaré vêm a inspiração e a força para lutar contra tudo isso que atenta contra a família humana.

Na obediência, na admiração e na confiança no Deus libertador é que reafirmamos nossa fé na presença salvadora de Jesus, o verbo encarnado, que escolheu a família de Nazaré para assumir nossa carne e nossas lutas.